domingo, 20 de novembro de 2011

Certezas, precisam-se
Preciso urgentemente de adquirir meia dúzia de valores
absolutos,inexpugnáveis e impenetráveis,firmes e surdos como
rochedos.
Preciso urgentemente de adquirir certezas,certezas
inabaláveis, imensas certezas, montes de certezas,certezas a propósito de
tudo e de nada,afirmadas com autoridade, em voz alta para que todos
oiçam,com desassombro, com ênfase, com dignidade,acompanhadas de
perfurantes censuras no olhar carregado, oblíquo.
Preciso urgentemente de ter razão,de ter imensas razões, montes de razões,de eu próprio me
instituir em razão.Ser razão!
Dar um soco furibundo e convicto no tampo
da mesae espadanar razões nas ventas da assistência.
Preciso urgentemente de ter convicções profundas,argumentos decisivos,ideias
feitas à altura das circunstâncias.
Preciso de correr convictamente ao encontro de qualquer coisa,de gritar, de berrar, de ter apoplexias sagradas em defesa dessa coisa.
Preciso de considerar imbecis todos os que tiverem opiniões diferentes da minha,de os mandar, sem rebuço, para o diabo que os carregue,de os prejudicar, sem remorsos, de todas as maneiras
possíveis,de lhes tapar a boca,de lhes cortar as frases no meio, de lhes virar as costas ostensivamente.Preciso de ter amigos da mesma cor, caras unhacas,que me dêem palmadinhas nas costas,que me chamem pá e me façam brindesem almoços de camaradagem.
Preciso de me acocorar à volta da mesa do café, e resolver os problemas sociaisentre ruidosos alívios de expectoração.
Preciso de encher o peito e cantar loas,e enrouquecer a dar
vivas,de atirar o chapéu ao ar,de saber de cor as frequências dos
emissores.
O que tudo são símbolos e sinais de certezas.
Certezas!Imensas certezas! Montes de certezas!
Pirinéus, Urais, Himalaias de certezas!
António Gedeão

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